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ADPF das Favelas

Complexo da Maré teve 42 operações policiais e 20 mortos em 2024

O Complexo da Maré, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, teve 42 dias de operações policiais em 2024, que deixaram 20 mortos.


O Complexo da Maré, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, teve 42 dias de operações policiais em 2024, que deixaram 20 mortos. O levantamento, feito pela organização não governamental Redes da Maré, foi divulgado nesta sexta-feira (21).

Segundo a ONG, o nĂșmero de operações policiais é seis vezes maior que o registrado em 2021, quando houve sete incursões desse tipo. A Redes da Maré argumenta que a pesquisa mostra que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecida como ADPF das Favelas, não impede a realização de ações policiais, como argumentado pelo governo fluminense.

A ONG destaca ainda que, desde 2022, o nĂșmero de operações policiais no complexo de favelas vem crescendo: em 2022, foram 22 operações, com 26 mortes; e, em 2023, 34 operações, com oito mortes.

"A ADPF é resultado de evidĂȘncias de que é preciso haver um controle sobre a atividade policial. A ADPF nunca foi para impedir que a polĂ­cia trabalhasse. Ao contrĂĄrio, a gente questiona que a operação policial seja a Ășnica forma de a polĂ­cia entrar aqui na Maré ou em qualquer outra favela", explica a diretora fundadora da Redes da Maré, Eliana Sousa Silva.

Das operações policiais realizadas em 2024, 88% foram próximas a escolas, que resultaram em 37 dias de suspensão das aulas, afetando cerca de 7.302 alunos em média. Além disso, cerca de 90% das operações aconteceram perto de unidades de saĂșde, o que resultou em 30 dias sem serviços bĂĄsicos de saĂșde, com 8.715 atendimentos adiados.

De acordo com a Redes da Maré, em apenas 26 das 42 operações policiais foi observada a presença de câmeras corporais e, em 17 delas, poucos policiais usaram o equipamento. Das 20 mortes registradas, somente quatro tiveram perĂ­cia de local. Em 17 casos, foram observados indĂ­cios de execução, a partir de relatos de moradores e evidĂȘncias coletadas por familiares das vĂ­timas.

ADPF

A ADPF 635 foi impetrada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), em 2019, sob a justificativa de que ações policiais incentivavam a letalidade promovida pelo Estado, em vez de prevenir mortes e conflitos armados.

Em 2020, devido à covid-19 e com base na ADPF, o ministro do STF Edson Facchin decidiu suspender as operações policiais em comunidades do Rio durante a pandemia. As ações deveriam ser restritas a casos excepcionais e ser informadas previamente ao Ministério PĂșblico do Rio de Janeiro (MPRJ).

Também foram determinadas a instalação de câmeras nas fardas e equipamentos de GPS de policiais, a gravação em ĂĄudio e vĂ­deo nas viaturas e a restrição ao uso de helicópteros apenas para casos de estrita necessidade. A realização de ações próximas a creches, escolas e unidades de saĂșde deveria ser excepcional e justificada ao Ministério PĂșblico. Além disso, foi proibido o uso dessas instalações como base policial durante as operações.

Mas o governo do estado critica a ADPF sob a alegação de que ela prejudica o trabalho da polĂ­cia ostensiva. Em fevereiro deste ano, o governador fluminense, ClĂĄudio Castro, disse que achava positivas as situações em que a ADPF viesse a melhorar a atividade policial e a transparĂȘncia das ações, mas considerou que a "extraordinariedade" exigida para a realização das operações tirava do povo "o direito de ter uma polĂ­cia ostensiva". O julgamento da ADPF foi marcado para o próximo dia 26.

Outros dados

A pesquisa da Redes da Maré também traz dados sobre invasões de domicĂ­lio durante ações policiais. Em 2024, 93 casas de moradores foram invadidas sem mandado judicial por policiais. Em um Ășnico dia, 3 de setembro, foram 29 residĂȘncias invadidas.

As invasões naquele ano foram seguidas de violações de direitos como danos ao patrimônio (30 casos), subtração de pertences (dez), violĂȘncia fĂ­sica (seis), tortura (cinco) e ameaça (12).

De 2016 a 2024, foram 267 invasões, nas quais 67% das vĂ­timas foram mulheres cis e mulheres trans e 72% foram de pessoas pretas ou pardas.

"A sociedade não pode aceitar, naturalizar que, na favela, a polĂ­cia esteja autorizada a não cumprir o que existe legalmente. A Ășnica forma de enfrentamento ao crime, às redes ilĂ­citas, não pode ser vocĂȘ suspender direitos de uma população tão significativa. A cidade do Rio de Janeiro é composta de um terço de pessoas que moram em ĂĄreas de favelas e periferias", afirma Eliana.

A assessoria de imprensa da PolĂ­cia Militar informou que só comenta dados oficiais. A PolĂ­cia Civil não respondeu à redação.

AgĂȘncia Brasil

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