Os indicadores de triagem neonatal mais recentes publicados pelo Ministério da SaĂșde mostram que, em 2020, mais de 80% dos bebĂȘs fizeram o teste, mas apenas 58% tiveram o sangue colhido até o quinto dia de vida, que é o ideal. Mesmo em 2019, antes da pandemia de covid-19, o Ăndice não chegou a 60%.
Segundo a professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Tânia Bachega, é importante que o teste seja feito depois de 48 horas, mas antes do quinto dia de vida do bebĂȘ.
"Pela metodologia de anĂĄlise dos exames, não dĂĄ para colher o teste antes porque daria falso negativo para bebĂȘs afetados, mas tem que ser realizado logo porque o teste do pezinho é um exame que detecta a suspeita. Se der positivo, rapidamente, o bebĂȘ deve fazer um exame mais preciso confirmatório. Se confirmou, é encaminhado para a rede especializada, onde ele vai receber o tratamento e a medicação."
A médica explica que, nos locais onde o perĂodo de internação pós-parto é de pelo menos 2 dias, os próprios hospitais costumam colher o sangue do pezinho do bebĂȘ antes que mãe e filho tenham alta. Mas quando a famĂlia deixa a maternidade antes, é preciso procurar uma unidade de saĂșde no tempo certo.
Tânia é membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e especialista em uma das doenças detectadas pelo teste do pezinho, a hiperplasia adrenal congĂȘnita, uma condição que pode levar o bebĂȘ à morte por desidratação em poucos dias, mas, se for diagnosticada logo, o tratamento é acessĂvel e pode garantir que o bebĂȘ se desenvolva sem qualquer sequela.
"A hiperplasia adrenal congĂȘnita ocorre em um de cada 10 mil nascimentos e é uma doença das glândulas adrenais que ficam em cima dos rins e produzem um hormônio essencial para manter a vida, que é o cortisol. O bebĂȘ perde sal, perde ĂĄgua, desidrata e, frequentemente, entra em choque e morre. E, quando estĂĄ em choque, os pediatras confundem com septicemia, com infecção generalizada, e uma Ășnica injeção com uma dose pequena de cortisona salva o bebĂȘ", afirma a professora da USP.
Outra doença hormonal rara que pode ser detectada pelo teste do pezinho é o hipotireoidismo congĂȘnito, "a causa mais frequente de deficiĂȘncia intelectual grave que pode ser totalmente evitĂĄvel com tratamento precoce", diz Tânia Bachega. Para não haver risco de sequelas, o bebĂȘ precisa ser diagnosticado e começar a receber o hormônio da tireoide com menos de 30 dias de vida.
No entanto, de acordo com a especialista, além de muitos bebĂȘs não serem testados no momento certo, é comum que se passem alguns dias até que o material seja transportado para os laboratórios de referĂȘncia e mais alguns até que o resultado retorne à unidade de saĂșde. E nem sempre a famĂlia é chamada para buscar o laudo imediatamente.
Por isso, Tânia Bachega diz que o governo federal precisa intensificar a fiscalização, para saber se os estados e municĂpios estão cumprindo as normas do Programa Nacional de Triagem Neonatal, instituĂdo em 2001. A médica acrescenta que as verbas federais para a aquisição de kits de testagem precisam ser reajustadas, para evitar desabastecimento.
O Ministério da SaĂșde foi procurado para falar sobre a situação, mas ainda não respondeu.
Atualmente, sete doenças podem ser diagnosticadas pelo teste do pezinho, que é oferecido pelo Sistema Ănico de SaĂșde: fenilcetonĂșria, hipotireoidismo congĂȘnito, doença falciforme e outras hemoglobinopatias, fibrose cĂstica, hiperplasia adrenal congĂȘnita, deficiĂȘncia de biotinidase e toxoplasmose congĂȘnita. Algumas unidades federativas, porém, oferecem exames ampliados que identificam até 62 doenças, como é o caso do Distrito Federal.
Em 2021, entrou em vigor uma lei que amplia o teste do pezinho para detectar até 50 doenças. Entretanto, isso serĂĄ feito de maneira escalonada e, por enquanto, apenas a toxoplasmose congĂȘnita entrou no painel bĂĄsico de exames.
AgĂȘncia Brasil